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segunda-feira, abril 29, 2024

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Declarações preconceituosas de candidato à Prefeitura de São Paulo causa indignação e revolta dentro da Cultura Hip-Hop

Mamãe falei demais!

Na última quinta-feira (1), aconteceu o primeiro debate das eleições de 2020 na Band TV. Foram convidados os candidatos Andrea Matarazzo (PSD), Arthur do Val (Patriotas), Bruno Covas (PSDB), Celso Russomanno (Republicanos), Filipe Sabará (Novo), Guilherme Boulos (PSOL), Jilmar Tatto (PT), Joice Hasselmann (PSL), Márcio França (PSB), Marina Helou (Rede) e Orlando Silva (PCdoB). O debate foi realizado sem plateia por causa da pandemia de Covid-19 e foi marcado por muitos números imprecisos, falta de conhecimento, informações desencontradas e atitudes preconceituosas.

Exemplo da lambança já esperada, foram mais uma vez as declarações do candidato Arthur do Val (Patriotas), antes do debate ele publicou no Instagram um vídeo de preparação com uma paródia do pugilista Rocky Balboa se preparando para uma luta, como na série de filmes estrelados por Sylvester Stallone. Na chegada à TV Bandeirantes, ele afirmou que não vinha para brigar, mas o que fez foi bem diferente do seu discurso. De cara, criticou Bruno Covas (PSDB), que disputa a reeleição, Celso Russomanno (Republicanos), que lidera as pesquisas e o ex-prefeito Fernando Haddad (PT).

Mas o pior dos momentos foi quando começou a falar da Escola 360, que segundo ele estaria aberta finais de semana e nas férias e com descaso começou a atacar a Cultura Hip-Hop, dizendo: “Os filhos das mães da periferia terão seus filhos dentro da escola e não gastando energia com aulas de picho e de break dance”. Essa frase foi o estopim para uma enxurrada de reações imediatas de revolta e indignação entre artistas, federação representativa e praticantes da cultura.

Numa nota de repúdio, a Federação Paulista de Breaking (FSPB) por meio de seu Vice-Presidente Rooneyoyo se pronunciou e entre muitas coisas escreveu “…o candidato demonstra total desconhecimento da realidade das comunidades periféricas, sendo uma cultura de transformação social, tirando milhares de crianças e jovens de situações de risco, da criminalidade e traz para áreas vulneráveis a educação, a cultura, gerando oportunidades. O Breaking e não o “break dance” falado erroneamente pelo candidato ao se referir a essa importante expressão cultural, assim como o Graffiti e todos os elementos dessa cultura, salvam vidas todos os dias. É lamentável que uma pessoa que proclama a educação como um dos pilares de seu plano de governo tenha uma visão social tão limitada, preconceituosa e distante da realidade urbana de São Paulo. Isso só reafirma a dúvida sobre sua capacidade como político e gestor para postular o cargo de Prefeito de São Paulo”. A Federação, além de divulgar a nota de repúdio, criou um abaixo-assinado que está circulando entre os artistas da cultura e está tomando as atitudes judiciais cabíveis.

Ainda, outros artistas se manifestaram, como o B-Boy Pelezinho, que foi o primeiro B-Boy brasileiro a chegar na final mundial da Red Bull BC One, ele gravou uma mensagem em vídeo: “Cara, você tem que ter respeito pelas pessoas, a dança Breaking mudou a minha vida e de muitos jovens, isso que você acabou de falar na televisão e na rede social eu acho que você não está preparado e nem capacitado para assumir cargo nenhum. Você tem que respeitar apenas isso! Você pode ter certeza que o que você fez a dança vai te cobrar! Espero que você pense no que falou e respeite a nossa cultura!”.

No Instagram, o B-Boy Neguin, outro grande B-Boy brasileiro, ganhador da Red Bull BC One Mundial, consagrado globalmente por sua dança, escreveu: “Quanto audacioso e infeliz você é em desrespeitar a cultura universal em rede nacional meu caro. Aulas de “break dance” me levaram para 139 países, consulte com o maior centro financeiro da América Latina quanto custa para um cidadão viajar para essa quantidade de países, falo 4 idiomas, tenho dupla cidadania, sou um dos artistas mais reconhecidos e requisitado mundialmente por sempre representar o nosso país em diversas áreas e em todos os meios artísticos. Sou campeão mundial de “break dance” patrocinado pela Red Bull há 13 anos. Levo a Capoeira, o Graffiti e o Jiu-Jitsu onde vou, isso salvou minha vida e de milhares de outras pessoas também. Espero que você reflita e corrija as asneiras que falou pois sua ignorância é realmente inacreditável”.

O B-Boy Ricka, da lendária Back Spin Crew, comentou: “Eu acabei de ver um vídeo de um tal de Arthur de um canal chamado “Mamãe falei” que fala do “break dance” de forma pejorativa. Meu amigo, não é “break dance” você nem sabe o que está falando! É Breaking, um dos elementos da Cultura Hip-Hop, que é uma cultura mundial que movimenta o sonho de pessoas, sonho da periferia, que faz com que as pessoas sejam protagonistas da sua própria história. Você está falando do Hip-Hop, mano! Hip-Hop dá oportunidade para pessoas e resgata vidas. Você está querendo um cargo na maior cidade do país, você quer ser prefeito de São Paulo, então você tem que saber o que está falando. Nós somos atuantes através do Breaking e dos outros elementos na periferia, onde pelo jeito você nunca pisou. Antes de falar do Breaking você tem que ter conhecimento que tem toda uma comunidade por trás que vivem isso todos os dias. O Hip-Hop é uma cultura que sustenta pessoas, emprega pessoas, nós temos economia criativa você não tem noção do que está falando. Nós estamos presente onde você não está! Você tem que fazer a lição de casa, se você quer conduzir uma cidade como São Paulo você tem que respeitar todas as culturas e todas as pessoas, tem muito a aprender com a Cultura Hip-Hop”.

Fabgirl, uma das mais conhecidas B-Girls brasileiras, representando as mulheres do Hip-Hop, também falou: “Tem um meme do Caetano que cabe muito bem nesse momento, você é burro cara, o que você está falando é burrice, não consigo te compreender, nós que somos do Hip-Hop sabemos muito bem o poder que a dança, o Graffiti, o DJ e o MC tem na vida das pessoas, entra governo e sai governo e nós continuamos fazendo o nosso trabalho”. Ainda B-Boy Till, de Fortaleza, explanou: “Eu sou apaixonado pelo Breaking e não entendi sua atitude de agredir o Hip-Hop, que tira tantos jovens da criminalidade”. 
 As declarações do candidato chegaram no exterior, em alguns B-Boys que representam a cultura lá fora. B-Boy Kid Guma, que está na França, também gravou um vídeo mandando o candidato respeitar o Breaking e a Cultura Hip-Hop. Ele disse: “Hoje eu vivo através do Breaking na Europa, se você não sabe o valor que o Breaking tem vai fazer uma pesquisa, vai estudar sobre a cultura periférica”. B-Boy Luka escreveu: “Primeiro vem a gratidão de ter conquistado tudo através do Breaking. A minha dedicação e investimento nesse elemento me trouxe vida, a disciplina, algo que vou levar para toda a vida…”. Ainda muitos outros B-Boys e B-Girls comentaram, entre eles B-Boy Leony, B-Boy Kamal, B-Boy Buxexa.

A nova geração também se manifestou. B-Boy Eagle, de 13 anos, da Dream Kids Brasil, lembrou: “Somos uma cultura forte no mundo inteiro, no Breaking aprendemos a respeitar, a ganhar, a perder, a ter disciplina, a ajudar o próximo e principalmente a não pensar limitado como você. Breaking é vida, família e valores que eu tenho com 13 anos e você até hoje não aprendeu essa lição. Que vergonha de você!”.

O DJ Heliobranco também se expressou: “Eu tenho 35 anos de Hip-Hop e eu nunca vi tanta asneira de alguém que se propõe a ser representante do povo da capital paulista, uma das três maiores cidades do planeta. Você se deu mal comigo, mano. O Hip-Hop é pelo social. O Sr. Arthur do Val não me representa! Eu sou do Hip-Hop All Stars, o pessoal do Hip-Hop de São Paulo não apoia o senhor!”.

Algumas mídias especializadas na Cultura Hip-Hop também comentaram. Em Ipatinga (MG), o responsável pelo Portal de Cultura Urbana, B-Boy Luizin, falou: “Vai estudar, irmão, o que é a Cultura Hip-Hop, o que é o Breaking. O Breaking salvou a minha vida. Você falou besteira e a Cultura Hip-Hop vai te cobrar tenha certeza!”. O Portal Breaking World também fez uma nota de repúdio às declarações do candidato. A jornalista e editora do Portal Breaking World, Luciana Mazza, escreveu em sua rede social: “O Breaking e o Graffiti são também manifestações sociais importantes e legítimas. O Breaking foi lembrado pelo Comitê Olímpico Internacional para se tornar modalidade olímpica em Paris 2024, só no Brasil temos mais de 40 Campeões Mundiais de Breaking em diversos campeonatos espalhados pelo mundo, nas várias modalidades que o compõem. E o Graffiti está presente nos principais centros urbanos, financeiros e artísticos do mundo, como na Times Square, em Nova York, em San Diego, em Londres ou na Paulista, no Brasil. Veja, sou jornalista, cineasta, editora de um portal de Breaking, sou mãe de B-Boy e de B-Girl e tenho muito orgulho de dizer que os meus filhos pertencem à Cultura Hip-Hop! O Breaking foi uma das melhores escolhas de suas vidas! Jamais podemos nos calar diante de palavras tão inadequadas e preconceituosas! Enfim: Respiramos arte, educação e não preconceito! Caro Deputado desprezível: “Mamãe falei besteira!”, respeite o Breaking, respeite o Graffiti, respeite a Cultura Hip-Hop, respeite a vida e os cidadãos paulistanos de bem!”, concluiu.

Sobre as declarações de Arthur do Val, algumas personalidades se manifestaram, como a sambista Leci Brandão. Ela em vídeo opinou: “Minha galera querida do Hip-Hop, estou passando para reforçar o quanto que eu respeito a cultura de vocês, não tem outro gênero musical que fale mais da realidade das comunidades do que o Rap, nós temos DJ’s, grafiteiros e breakers conhecidos no mundo inteiro, a cultura Hip-Hop salvou e continua salvando muitas vidas, cuidando da juventude. O Breaking inclusive está nas Olimpíadas e nós temos o Dia do Breaking que está lá na ALESP”, finalizou.

Não é a primeira vez que o candidato e também youtuber Arthur do Val se envolve em polêmicas, no mês de setembro foi condenado pela justiça quando publicou vídeos antes do início da campanha eleitoral, acusando o Padre Julio Lancellotti. A Justiça Eleitoral determinou que essas publicações de Arthur do Val fossem retiradas das redes sociais. Nelas, o candidato, também conhecido como “Mamãe Falei”, continuou as críticas e ataques contra o Padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo. Val chegou a qualificar Lancellotti como “cafetão da miséria” e a acusar, sem provas, que ele fomentaria o tráfico na região central da capital paulista. A decisão foi assinada pelo juiz Emílio Migliano Neto. O MPE (Ministério Público Eleitoral) disse que o candidato produziu “propaganda eleitoral antecipada e vedada em que, seguidamente, calunia, difama e injuria o padre, objetivando tornar-se mais conhecido do eleitorado, ao criar polêmica em relação à figura pública do padre”.

O candidato também fez críticas recorrentes ao atendimento de ONGs e setores da Igreja Católica e aponta políticas públicas “ineficientes” como responsáveis pela “degradação” do centro. Ele também chegou a fazer gravações na região da Cracolândia, no centro de São Paulo, que também são alvo de investigação. A Promotoria, inclusive, chegou a pedir para a PF (Polícia Federal) abrir inquérito para investigar se os vídeos violam a lei eleitoral.

Quanto ao Hip-Hop, também não é a primeira vez que faz comentários pejorativos. Em 2018, ele em um de seus vídeos falou que o álbum “Sobrevivendo ao Inferno”, dos Racionais MC´s, era uma poluição sonora, isso porque a Unicamp colocou na sua lista de obras para o vestibular de 2020 o álbum de 1997, no gênero de poesia, o que irritou ao candidato, o fazendo se envolver em mais polêmica.

Arthur do Val é nascido em São Paulo, ingressou na faculdade de Engenharia Química no Instituto Mauá de Tecnologia, mas não chegou a se formar. Seu pai é dono de uma empresa de sucata de aço, na cidade de Guarulhos, onde Arthur trabalhou antes de começar a fazer vídeos para a internet. Além disso, também é empresário no ramo de estacionamento e postos de gasolina. Em 2015 criou, seu canal no YouTube, que hoje conta com mais de 2,5 milhões de inscritos. Eleito em 2018 com 478.000 votos, a segunda maior votação da Assembleia Legislativa, o deputado Arthur do Val (Patriotas), conhecido como “Mamãe Falei”, defendeu e apoiou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), juntamente com o MBL, sendo conhecido pelas diversas polêmicas que costuma se envolver. 

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