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terça-feira, março 19, 2024

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Pela força da amizade, Sabota ultrapassa os limites do tempo

Novembro Negro: Conteúdo especial, com participação de jornalistas, reportagens e entrevistas sobre negros, negritude, empoderamento e afins.

Por Juca Guimarães*
Especial para o ZonaSuburbana

Um álbum é o registro de um tempo. É a expressão do artista em um determinado período. Ali estão suas influências, inspirações e experiências. No caso do álbum “Sabotage” (2016), lançado no dia 17 de outubro, quase 13 anos e dez meses após a sua morte trágica e violenta, a obra vai muito além e transcende todos os limites de tempo e espaço.

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Capa “Sabotage” (2016)

O esperado disco do Sabotage é instigante e único pois, além da força e da criatividade de um dos melhores rimadores do Brasil, há ali o resultado de um árduo trabalho de amigos, produtores e parceiros para atualizar e eternizar a música do Sabota, o maestro do Canão (favela na região do Brooklin, na zona Sul de São Paulo, onde o rapper morou).

Naquela manhã de 24 de janeiro de 2003, véspera do feriado que comemora o aniversário de São Paulo, Maurinho estava voltando do ponto de ônibus onde tinha ido acompanhar a mulher que ia para o trabalho, quando foi atingido por quatro tiros. Não se sabe, mas é possível que depois de deixar a esposa na condução o rapper estivesse caminhando e pensando nos próprios compromissos do dia, entre eles a gravação do seu segundo álbum. Letras, ideias e batidas já tomavam forma nas conversas e reuniões com o amigo e produtor Daniel Ganjaman, do Instituto, aquele seria o disco da virada na história do rap e do Sabotage.

A autoafirmação do segundo álbum, quando geralmente o artista mostra mais maturidade e segurança, está presente em Sabotage (2016), assim como as referências e tensões de 2003 que não passaram desapercebidas e foram captadas pela caneta do Sabota. Um exemplo são os versos que falam sobre o assassinado do índio Galdino, na faixa de abertura “Mosquito”. Em 1997, cinco jovens de classe média alta de Brasília atearam fogo em um índio que dormia no ponto de ônibus. Em 2001, eles foram condenados, por crime hediondo, a 14 anos de prisão em regime fechado. Mas em 2002, a Justiça concedeu o benefício para que quatro deles pudessem sair da cadeia e trabalhar em departamentos públicos.

Balas perdidas, drogas, racismo, violência policial são alguns dos outros temas presentes no disco que, infelizmente, ainda estão atuais no cotidiano. As rimas de “Sai da Frente”, “País da Fome – Homens Animais” e “Míssel” são cores vivas tanto em 2003 como em 2016.

A grande sacada do disco é o diálogo atemporal que as participações especiais fazem com o Sabotage. Por exemplo, o BNegão traz uma referência a eleição do Obama no EUA, em 2008, cinco anos após a morte do rapper.

A mistura do rap com o samba aparece na dançante e malandra “Maloca é Maré”, dividida com o amigo e incentivador Rappin’ Hood. Em “Gatilho” a levada lembra uma balada e o Sabota mostra o seu talento de cantor. Em “Canão Foi Tão Bom”, a voz inconfundível do rapper DBS Gordão Chefe faz referência ao primeiro álbum do Sabota. O rapper Dexter, Oitavo Anjo, brilha na faixa “Quem Viver Verá” junto com o DJ Cia e o Sabota, uma das melhores do álbum.

Juca Guimarães: Jornalista do Portal R7 (Militante negro e periférico que leva pautas da cultura de rua aos grandes veículos. Trabalhou nas redações dos jornais Gazeta Mercantil, Agora São Paulo, Diário de São Paulo).

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